Resumo
O presente artigo examina as hipóteses de anulação de arrematação judicial prevista no art. 903, § 4º do Código de Processo Civil . São discutidos os efeitos da sentença anulatória, a responsabilidade do exequente e a proteção do arrematante de boa-fé, bem como a necessidade de sua defesa obrigatória sob pena de presunção de má-fé. Mediante análise crítica, são apresentados exemplos práticos e jurisprudências relevantes, reforçando o princípio da segurança jurídica e da boa-fé objetiva.
Palavras-chave: Arrematação judicial, nulidades na arrematação, arrematante de boa-fé, impugnação à arrematação, ação anulatória da arrematação, embargos à execução
1. Introdução
A arrematação judicial é o ato que concretiza a alienação do bem penhorado, proporcionando a satisfação do crédito exequendo. Contudo, nem sempre o procedimento ocorre de forma regular. Quando há vícios que comprometem a validade do leilão, o sistema jurídico prevê diversas possibilidades de anulação.
No contexto do presente, a tensão reside entre a legalidade do procedimento e a proteção do arrematante de boa-fé, figura essencial para a segurança jurídica. Se, de um lado, deve-se corrigir as nulidades que prejudicam o executado ou terceiros, de outro, a boa-fé objetiva impede que o arrematante seja prejudicado por irregularidades que não deu causa. Este artigo aborda as nuances do artigo 903, § 4º, suas implicações processuais e a obrigação do arrematante em se defender para afastar a presunção de má-fé.
2. Fundamentos e finalidade da anulação da arrematação
O art. 903, § 1º do CPC estabelece que a arrematação pode ser anulada em quatro situações:
1. Descumprimento das formalidades processuais: Qualquer irregularidade nos arts. 886 a 903 do CPC, como falta de publicidade, ausência de intimação do executado ou vícios no edital.
2. Acordo ou remição da execução: Se comprovada a existência de acordo ou se o executado pagar a dívida antes da realização do leilão, a arrematação deve ser desfeita.
3. Preço vil: Quando o bem é arrematado por valor manifestamente baixo. O conceito de preço vil é pacificado na jurisprudência em 50% do valor da avaliação.
4. Fraude na execução: Manipulações fraudulentas ou conluio entre participantes do leilão, o que compromete a legitimidade do processo.
O artigo 903 § 4, por sua vez, visa corrigir irregularidades graves sem comprometer o princípio da segurança jurídica, protegendo o arrematante de boa-fé.
3. Prazos e formas para impugnação da arrematação
O dispositivo que regula a arrematação é claro e objetivo:
• Art. 903, § 1º:
"Assinado o auto de arrematação, a nulidade da arrematação poderá ser arguida nos 10 (dez) dias subsequentes, em petição fundamentada, dirigida ao juiz da execução."
Assim, a impugnação não ocorre por meio de recurso, mas por petição fundamentada dirigida ao juiz da execução.
Após a arrematação, não há recurso específico previsto no CPC para sua desconstituição. Como vimos, o ato pode ser impugnado nos seguintes termos:
• Petição fundamentada: No prazo de 10 dias, como prevê o art. 903, § 1º. Caso qual, a nulidade deve se basear em alguma dessas hipóteses:
1. Descumprimento das formalidades legais (arts. 886 a 903);
2. Existência de acordo entre as partes ou remição da execução;
3. Preço vil;
4. Fraude na execução.
Estabilidade da Arrematação
Caso não haja impugnação no prazo de 10 dias, ou se a nulidade não for reconhecida, a arrematação se torna definitiva, garantindo:
• Estabilidade do ato judicial;
• Proteção ao arrematante de boa-fé;
• Celeridade e efetividade da execução.
4. Ação Autônoma para Desconstituir a Arrematação
Artigo 903, § 4º, do CPC
"Após a expedição da carta de arrematação ou da ordem de entrega, a invalidação da arrematação poderá ser pleiteada por ação autônoma, em cujo processo o arrematante figurará como litisconsorte necessário"
Distinção Entre Petição e Ação Autônoma
• Petição no Prazo de 10 Dias: A impugnação direta, feita nos 10 dias subsequentes à assinatura do auto de arrematação (§ 1º do art. 903), é cabível nos casos em que as partes ou terceiros interessados identificam o vício rapidamente.
• Ação Autônoma: Quando os vícios são identificados posteriormente ou quando não é possível a desconstituição por simples petição, cabe ajuizamento de ação própria.
O legislador buscou um equilíbrio entre a proteção do ato da arrematação e a necessidade de corrigir vícios graves.
5. Efeitos da sentença que reconhece a nulidade da arrematação
Proteção ao Arrematante de Boa-Fé
O arrematante de boa-fé é protegido pela legislação processual. Mesmo que o leilão tenha vícios ou irregularidades reconhecidas judicialmente, o arrematante:
• Tem o direito de ficar com o bem arrematado;
• Não é obrigado a devolver o bem.
Efeito Exclusivo Sobre o Exequente e os Responsáveis
A sentença atinge apenas:
• O exequente, que pode ser responsabilizado por atos irregulares;
• Os responsáveis pela venda incorreta
Há Irreversibilidade da Arrematação em Favor do Arrematante Se o arrematante está de boa-fé, o bem permanece com ele, mesmo que a nulidade seja reconhecida.
Os prejudicados podem buscar indenização contra os responsáveis pela irregularidade.
6. Por que o arrematante é obrigado a se defender?
Presunção de Veracidade dos Fatos Alegados (Art. 344 do CPC). Caso o arrematante não apresente defesa, os fatos alegados podem ser presumidos verdadeiros. A defesa é essencial para que o arrematante demonstre sua boa-fé e proteja seus direitos.
Se a má-fé for comprovada, o arrematante pode perder o direito ao bem arrematado e ser responsabilizado por prejuízos.
Referências
BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2023.
Wilian Dias Advogados